Sérgio Niza, professor universitário com uma longa carreira alicerçada na Educação, aprofunda o papel vital da leitura, da escrita e da importância da preparação intelectual do professor para que se gere o conhecimento. Crítico contundente (embora nem sempre passível de concordância) e num discurso frontal, declara-se contra uma postura “clássica” no ensino. Saliento estas passagens:
“SN: Os caminhos da cultura e da educação, que se fundem, requerem continuidades muito grandes. Transformações, mas continuidades. Raramente saltos! (…)
E: Esse ancoramento na história e na cultura vem marcar toda a tua visão da escola e da pedagogia.
SN: A Escola para mim é um instrumento poderosíssimo para regular e construir a pluralidade cultural e fazer caminho para a unidade da ciência. E se se perde essa dimensão, perde-se tudo. Sempre entendi um professor como um intelectual, como um trabalhador intelectual. (…) E que um dos seus instrumentos mais poderosos, também um dos artefactos mais poderosos da invenção humana, é a escrita. (…). É através da acção de construção de textos pela fala e pela escrita, que se constrói também o conhecimento. Esta falta de consciência leva a que só o professor é que fala. Mas se o aluno não pode falar o conhecimento, está impedido de utilizar uma estratégia fortíssima para a construção do conhecimento. Se o aluno não escreve o conhecimento, se só responde a perguntas, como é que constrói a escrita do conhecimento? (…)
Os professores têm de aspirar sempre, não só a ser práticos, mas a pensar e a construir discursos sobre as suas próprias práticas (…) Essa possibilidade de pensar, projectar, dialogar a profissão é que funda a profissão. (…).
No diálogo que tenho mantido com António Nóvoa cheguei à conclusão de que teremos de acentuar mais a responsabilidade pública da educação. E voltar a rever, em conjunto, em sociedade, os vários papéis educativos: quer das famílias, quer das organizações privadas, quer das várias organizações públicas a vários níveis (desde os municípios, juntas de freguesia, Estado central, etc.). Rever os tempos e as acções e, provavelmente, rever também as responsabilidades da escola. Porque o que está a acontecer é uma inflação brutal de funções e responsabilidades todas atiradas para a escola (…)
(…) A apropriação do conhecimento faz-se pela construção e pela acção, pela fala ou pela escrita, e não é possível construir aprendizagens sem falar e escrever as aprendizagens. A construção do conhecimento, historicamente, foi sempre feita assim: dialogando, escrevendo. É necessário criar ambientes onde os alunos possam falar, possam dizer o conhecimento, escrever o conhecimento e pô-lo a circular, principalmente na sua comunidade, para perceberem, desde logo, como conhecer é socialmente útil. Eu não estou a aprender para amanhã. Eu estou a aprender para já. Tudo o que eu aprender tenho de partilhá-lo com os outros para ajudar os outros, e se estou a fazer um estudo eu apresento-o aos outros e submeto-o ao juízo dos outros. É ali que ganha sentido. Não é ao professor que eu vou ensinar. O professor é uma figura um pouco imaginária. O aluno tem de produzir para as pessoas reais, com o professor também lá dentro e que o ajuda a ir mais longe.”
Revista Educação. Temas e Problemas (Publicado no blog vox nostra)
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