7.11.08




Valter Figueira defende a literatura regional e fala sobre a formação do leitor

Fotos: Lira Netto
O professor especialista Valter Figueira que também é escritor de nossa terra, falou ao coração dos acadêmicos de uma forma didática e muito prática. A ele coube o tema A Formação do Leitor. A sua maneira de expor o tema a ele atribuído foi um compartilhar de experiências vivenciadas no seu dia a dia, desde a fase acadêmica até a atualidade. Fez questão de mostrar como Valter se tornou escritor e qual o caminho a ser trilhado por qualquer futuro escritor. Na experiência de Figueira, se pode perceber que a matéria prima será sempre a leitura e o resultado será a filtragem e compreensão do que se ler. Daí o próximo passo restará na produção de textos capazes de serem compreendidos por outros leitores. Um dos pontos fundamentais do Professor Figueira foi quando ele repassou aos presentes a experiência de um escritor que quando indagado se era um bom escritor ele respondeu que se considerava um bom leitor. A defesa da literatura clássica nacional e da produção literária regional também foi um dos pontos elencados pelo palestrante. A segunda Noite do evento Educacional da UNIFLOR foi tão importante para a formação acadêmica , que fluiu como um convite especial aos presentes, para que cheguem mais cedo na sexta feira (07), último dia do evento, sob pena de não encontrarem lugar para todos. Na sexta- feira, a literatura clássica brasileira fará parte de uma das palestras a serem ministradas e o doutor Santiago Vilela Marques falará sobre Machado de Assis, Cultura de Massas e Academia

Lançando meu livro em Cuiabá - MT




11.7.08

Poesia

Tenho Saudade

Tenho saudade de seu sorriso
simples, aberto, discreto,
sem malícia,
sem trevas.
Sorriso de deusa
que me comove,
me arranca lágrimas,
me deixa bobo:
Louco de amor.
Sorriso de devassa
que me arranha o peito,
que me engole na alma.
Torpe e tonto retribuo.
Sorriso de cura,
que encerra minhas chagas,
que me eleva ao trono,
que me faz seu rei.
Sorriso que me beija,
me beija simplesmente,
ardente beija...
simplesmente.

13.6.08

Eu matei... 1ª Edição e Doces Encantos


O livro Doces Encantos (esgotado) é composto de poemas com a temática a paixão.

MEU LIVRO "Eu matei..." 2ª Edição

Como uma pessoa simples e trabalhadora pode se trasnformar num assassino?
O que leva uma pessoa a matar seus amigos inocentes?
A resposta o leitor poderá encontrar nesta obra que conta a história de Homero Chaves, um presidiário detido no presídio de Alta Floresta no Estado de Mato Grosso, condenado por receptação de veículos roubado e tráfico de drogas. Na prisão ele decide contar sua história num livro. O que ninguém sabe, nem a polícia, é que ele cometeu três assassinatos numa pequena cidade do Norte do Paraná. Os crimes foram cometidos em intervalos de sete anos. O número sete incomoda o prisioneiro a ponto de acreditar que o seu destino é "abreviar a vida de pessoas amigas". O ano em que escreve o livro coincide com a sua soltura e também com o ciclo de sete anos do último crime. E isso deixa dúvida quanto ao seu comportamento fora da "cela cinzenta e fria". Homero é um bandido, mas também é uma vítima da sociedade que esquce dos marginalizados funcionais.

12.6.08

Conto

Litania dos loucos

Não diante você vir com esse papo de médico especialista em psiquiatria dizendo que sou louco, porque já gritei aos quatros cantos do mundo que não sou louco. Porque será que dizem quatro cantos do mundo sendo que o mundo é redondo? Tá vendo! Loucos são os poetas e escritores que inventam isso e depois ficam por aí ganhando dinheiro com mentiras e não sabem explicar o que escreveram. Inventam histórias que não viveram e dizem que é ficção. Ficção nada! Todas são que eles queriam ter vivido, para depois ficar contando para um monte de gente que lê e são chamados de leitores. Taí! Loucos são os leitores que ficam nas filas das livrarias comprando livros para ler e depois ficam sonhando com o que leu. É nada, louco é o livreiro que vende livros, vende emoções escritas nos papéis, inventam que quando a gente lê acaba viajando por lugares e mundos desconhecidos. Mas mais loucos ainda são os editores, eles acreditam em tudo que os escritores escrevem e publicam, porque acreditam que os leitores vão comprar. Louco na verdade é esse sistema de compra e venda que deixa todo mundo louco de raiva. Já disse, não adianta vir com esse papo que aqui é um hospital psiquiátrico e que você é um médico de loucos. Loucos são os poetas que ficam fazendo odes a musas distantes cantando amores impossíveis. Eles sim são loucos, ficam por aí contemplando os rostos belos e depois nas madrugadas frias, após uma dose e outra de vinho, fazem poesias, inventando paixões e sofrendo por elas. Eles sim são loucos. Quem? Os poetas aqueles que sofrem ao ler uma poesia que fala de um amor impossível. Sofre ao saber que outro poeta em outro tempo teve a mesma sina que a sua. Quem me dera saber Gregório de Matos. Se é meu amigo? Não, ele é um poeta da antiga que teve uma paixão proibida. Ele sim foi um louco. Apaixonar é coisa de louco. O que? A paixão é que move o mundo? Não, o que move o mundo é a loucura. Só uma pessoa louca é que quer fazer a diferença. Num mundo de iguais os diferentes são loucos. Num mundo de alienados, os não alienados são os loucos modernos. A mesmice está na moda, o copiar é fazer, e quem se aventura pela arte é o louco. A loucura é a arte. Já falei aos quatro cantos do mundo que não sou louco. Aliás porque será que falam quatro cantos do mundo se o mundo é redondo? Tá vendo loucos são os poetas e escritores que inventam isso e depois não sabem explicar.

Conto

O Homem e o mar

O sol estava ardendo como esteve ardendo toda a semana, parece que não chove faz muito tempo. De um lado é bom, sempre terá serviço. Se chover não se pode trabalhar. O duro é a poeira no meio do caminho, ela entra no caminhão e impregna nas narinas dos trabalhadores. Até a enxada, quando passa sobre o solo para cortar as ervas daninhas, levanta poeira. A terra seca lembra o nordeste, lugar ruim de chuva de onde vieram muitos que aqui estão. Papagaio não pode ter lá, senão as cabras comem achando que é mato só por que é verde. O chapéu panamá faz um pouco de sombra, não evitando que o suor corra como água de chuva no rosto de Zozé.
Água! Isso mesmo, é água que quer para matar a sede, para lavar a alma. Um rio de água, um mar de água. Que tamanho tem o mar? Será maior que a imaginação de Zozé que nunca viu e sonha em vê-lo?
Zozé pára de capinar, vai até a moringa e se sacia de um bom gole d’água, água de poço, boa, fresca, doce. Dizem que o mar tem água salgada, deve ser suja. Tanta coisa se joga no mar. O mar silenciosamente recebe tudo o que mandam, como um cemitério de coisas inúteis desprezadas pela humanidade. No retorno olha o horizonte, adiante uma linha quase azul faz com que o céu se encontra com a terra. Dizem que no mar é assim, você olha até onde as vistas alcança. Lá diante o mar se encontra com o céu, é tudo azul, dizem, ele mesmo não tem certeza, só vendo. Já viu na televisão preto e branco, não dá para saber se é azul.
Zozé sonha com o mar, uma imensidão de água que balança em ondas intermináveis. Aonde começa e termina o mar? Só Deus sabe! Que rumo se toma para ir ao mar? Dizem se tomar o caminho do sol se chega ao mar, de um lado chega mais rápido, de outro demora um pouco mas chega. Então? O mar rodeia a terra seca? Bem que poderia vir um pouco de mar para amolecer essa terra dura.
¾Sabe Zozé? Isso tudo aqui foi um imenso mar um dia. Mas um tempo muito distante que gente nem imagina. Agora, olha só que imensidão de verde. Parece um mar verde de tão grande. Não acha Zozé?
¾ Acho não! Mar tem que ser mar de água. Onde vivem peixes, como tubarão e baleia. Não pode ser mar de terra. E quem garante que aqui já foi mar. Só Deus sabe.
Zozé não sabia, assim como muitos não sabem, outros até tiveram a informação e não acreditam, que o mundo dá voltas e voltas e sofre diversas transformações. São transformações drásticas como a era do gelo, a era dos dinossauros e quem sabe, a era dos grandes mares que invadiram todo o espaço terrestre. Mas quem estava lá para contar? Só Deus sabe.
Todo homem tem que conhecer o mar, disse um vez um marinheiro. Aqui não tem mar. Será que esse marinheiro acha que todo mundo é viajante como ele? Isso foi na televisão, ele estava numa dessas cidade a beira mar. Lá é fácil, é só andar um bocado e já está pisando nas areais da praia. Muita gente mora lá e nem liga para o mar. E o barulho? Será que é o mesmo quando se pega uma casca de caracol e põe no ouvido? Dizem que sim. E assim, antes mesmo de conhecer o mar, Zozé já ouviu o seu barulho. O barulho das ondas se agitando.
¾ Uma parte do mar já conheço. O som. Agora tem que ir lá e comprovar se é azul, sentir o seu cheiro, correr em suas águas.
Mas o mar está longe. Longe na geografia e no tempo. Enquanto isso Zozé puxa motivadamente a enxada. Um dia ele verá o mar. Quando? Só Deus sabe.

poesia

Procurei você
Procurei você entre os transeuntes,
encontrei a solidão das horas.
Procurei meu berço esplêndido,
encontrei a mágoa do choro.
Procurei recantos e jardins
na ânsia de uma paixão
no limite de uma relva.
Procurei amigos nos bares,
botecos e becos escuros,
sujei a mão de graxa
encantando a ralé.
Procurei sexo nas ruas
sujas de um puteiro,
encontrei a amargura
de vidas solitárias.
Procurei dinheiro em bancos,
encontrei o débito sem perdão.
Procurei aventura na turvação de um rio,
e rir de uma mazela.
Procurei eu nos outros,
encontrei os outros em mim.

Conto

É Natal

O sol apregoava a costa de Zozé ali emborcado catando as maçãs de algodão que relavam no chão. Estão úmidas, vão render mais no peso. Zozé não levanta já faz quase vinte minutos. Suas costelas danam a doer, é sinal dos tempos que estão passando. O peso da idade judia da gente, não rende mais.
¾ Será que vai chover Zozé?
¾ Vai não, hoje você vai ter que mijar no fardo.
¾ Eles desconfiam Zozé!
O sol estava a pino, longe via-se uma manada de nuvens negras se achegando e se acomodando para juntar chuva.
¾ À tarde, depois da bóia chove Zozé.
¾ Cê num é adivinhadô!
¾ Não é advinhadô Zozé, é adivinho.
¾ Se qué ensiná, vai ser professor e não catadô de algodão!
¾ Calma Zozé, eu apenas quis ajudar. Nós estamos tudo na merda mesmo. Amanhã é Natal você sabia Zozé?
¾ E daí? Você vai chamar o papai Noel? Lá em casa não tem dessas coisas não.
Zozé sempre viveu e acredita que sempre viverá da roça. Mas essa roça de hoje não é como a de antigamente. No seu tempo de homem moço, forte, raçudo, era meeiro, morava na colônia, tomava água da mina e banho no riacho. Agora tudo é difícil, tem que pagar aluguel, pagar água, pagar luz, o dinheiro que tira não dá para nada. Nunca imaginou que teria de trabalhar duro até véspera de Natal. Para ele Natal nunca foi grande coisa, tinha as rezas, as novenas nos sítios vizinhos. Na cidade não, o povo enche a cara. Tá todo mundo querendo beber e ficar incomodando os que querem paz.
¾Zozé! Você tem carne no almoço hoje?
¾ Que nada! Só tem um zoião mesmo.
A carne é rara, aparece mais nos discursos utópicos dos sonhadores comedores de zoião. O ovo frito, que outrora era a esperança da continuação das galináceas, torna-se esperança de vida e alimento dos desesperados catadores de riqueza.
¾ Zozé! Um dia ainda vou ficar rico, você vai ver. Vou ajudar toda esse gente pobre que precisa trabalhar na véspera de Natal.
¾ É bom você trabalhar, senão nem para comer amanhã você tem. Deixa para sonhar de noite.
As bolas de algodão verdes incitavam a imaginação de Zozé, parecem bolinhas das árvores de natal. Zozé não entendia por que ele não encontrou ainda no mato uma árvore igual aquela. É pinheiro, disse certa vez dona Nina, não tem no mato. Porque será que não usam uma árvore fácil de encontrar? Como a mangueira? Ou jabuticabeira? Que são mais bonitas?
¾ Zozé! Você sabe o que o pessoal vai fazer hoje a meia noite?
¾ É a missa do Galo?
¾ Zozé!! Oh Zozé!! Acorda homem de Deus. Será que não lembra que a Missa do Galo é na Sexta-Feira Santa?
¾ Ah é?! Achei que era na Missa do Galo que aparecia o papai Noel, como o Galo não canta ele não aparece. E aonde é que ele aparece que eu nunca vi um de verdade?
Para Zozé, todos os que ele encontrou fantasiados de velhinhos vermelhos, eram na verdade personagens disfarçados de Papai Noel. Seu pai como não podia presentear a prole de 10 filhos, contou-lhe a verdade muito cedo. Assim, aprendeu na vida a diferenciar sonhos de realidade. Os Natais eram sempre iguais, e Zozé sabia que tinha que se esforçar para não ser alienado pela propaganda. Ou seria sentir inveja? Não! Zozé não era invejoso. Seu pai ensinou todos a conformarem com a situação, e pelo menos trabalhar para não passar fome. O Natal não coloca comida na mesa, não paga suas contas. Então! Como pode ficar em casa de papo para o ar e dizer que é Natal?
¾ Zozé!? Hei Zozé! Você vai comemorar o Natal em sua casa?
¾ Eu vou rezar na igreja.
¾ Não estou falando de rezar. Estou falando de festejar, tomar umas cachaças.
¾ E rezar não é comemorar? Será que Jesus Cristo quer que eu encha a cara para comemorar o nascimento Dele?
Zozé sabia, era esperto, apesar da simplicidade e da ignorância em certos assuntos de banco de escola que alguns teimam em dizer que é burrice, que para comemorar não é preciso encher a cara. Basta respeitar como ele respeitava. Basta amar o semelhante como ele amava. Como também basta viver como ele vivia.
Era véspera de Natal, as bolas de algodão lembravam luzes. A chuva aproximava, o vento balançava as folhas e Zozé ali na labuta embodocado catando as maçãs, as de baixo estão mais pesadas. Vai chover, que bom! Não será preciso mijar no fardo.

Conto

O triste fim do professor Célio

Ele estava sozinho em casa, como sempre estivera nos últimos anos. Faz tempo que não tem uma companhia para conversar, ou pelo menos relembrar os velhos tempos de magistério. Os amigos se foram, como parte de sua família, ou toda ela. Outrora foi bem afeiçoado. Era professor, homem das letras e de bons trejeitos. Foi membro do Clube Campestre, reunia com a alta sociedade. Foi presidente de partido, como era animada a casa em época de eleição, era um entra e sai de militantes e eleitores em busca de algo em troca do voto. Foi vereador, presidente da câmara, lembra com uma ternura bucólica desse tempo. Mas tudo se foi. O tempo abriu feridas, ou foram suas atitudes? E o tempo, esse desgraçado tempo, não conseguiu curá-las, ficaram remoendo como um câncer. É isso aí, um câncer que maltrata, que mata sem pedir licença. Onde foram todos? Não eram amigos, eram cânceres a dilacerar o cérebro ou as notas de valores bancários.
Raramente sai, as vezes uma saída rápida ao mercado em busca de alimentos, o mínimo para a sobrevivência, e é claro, não poderia se esquecer do velho barreiro, sua bebida preferida e remédio para espantar a solidão. Essa solidão que o deixa cada vez mais carrancudo, mais pensativo, parado no tempo e no espaço em busca de uma resposta. Uma só resposta que diga o que houve. Bebo para esquecer! Foi a resposta que dera a si mesmo quando se perguntou porque as lembranças o maltrata. Quero esquecer que fui alguém e que tive alguém.
Sua esposa há muito tempo partiu em busca de um sonhada independência. Agora é independente, quer sonhar sozinha. Lembra da última frase dela: “não quero terminar minha vida ao lado de um bêbado!” Seu filho Marcelo, foi ser advogado, está na capital, vive bem, um vez ou outra vem ver o pai. Por que viria mais? Ele tinha medo de seguir o mesmo caminho do pai. Tinha medo da tal hereditariedade, essa mania de filho ser igual ao pai. Não! Gritou certa vez a mãe – Ele não será igual ao pai.
Todo dia pela manhã recebe uma visita preciosa, a enfermeira Joana, que vem lhe aplicar a injeções de insulina e saber se está tudo bem. A Joana é atenciosa, bem diferente da outra enfermeira que o humilhava sempre dizendo: “Como pode um homem tão forte acabar assim desse jeito!” Como era o nome dela mesmo? Não se lembra, deixa para lá. Ainda bem que alguém o visita. Apesar de saber que é trabalho da Joana fazer-lhe visitas diárias, ele sempre a recebe como se fosse uma visita de cortesia. Gosta de inventar, assim foge com a solidão e a vergonha do abandono.
Foi até a geladeira, pegou um copo com água para fazer descer melhor os comprimidos da tarde, ou como poeticamente sempre respondia a Joana quando ela perguntava se havia tomado os comprimidos da tarde: “Ah! Os comprimidos do crepúsculo? Tomei sim e com uma dose de rimas poéticas!” E assim tirava um sorriso daquele rosto preocupado da bela Joana. Além da água, pega um copo com o velho barreiro ou “a água que passarinho não bebe!” Como costumava brincar com os seus companheiros de botecos.
Retorna ao quarto, coloca com carinho os copos na cabeceira da cama, joga num canto a muleta. Ah! A Muleta! Desde que amputou a perna esquerda ela tem sido sua companheira nas caminhadas matinais. Recusou a usar cadeira de rodas. Sempre achou que com a muleta sentiria mais livre, mais independente, mais agente e menos vítima.
Abre o criado mudo e lá estão algumas fotos antigas e para matar a saudade de tempos idos, procura algumas para distrair e sonhar. Depara com uma foto de uma família feliz. Ele, a esposa e o filho. Como o filho cresceu! Como o tempo passou e como ficamos velhos!. Outra foto em que ele participa de um formatura como professor. Foi professor daquela turma? Como estão todos? Que caminhos seguiram? É claro que no meio deles alguns hoje são pais de família, bóias-frias e cortadores de cana. Se não traçaram caminhos diferentes terão os mesmos destinos de seus pais. Onde está aquele menino que na primeira aula de português o surpreendeu com a leitura de um texto. Lembra que o pai desse aluno era um desses desgostoso da vida e companheiro de boteco. O que houve? Será que o pai do aluno entendeu aquilo como um elogio ou uma repreensão? E o aluno? O que aconteceu com ele? Há muitas perguntas para poucas respostas nesse mundo de lamúrias e sofrimento. Outra foto lhe chama a atenção, outra formatura, agora sua participação é como diretor da escola. São caras alegres como se estivem falando: “Futuro! Estamos prontos, venha!” Coloca a foto bem perto dos olhos para ver se reconhece alguns dos formandos, reconhece apenas um, sua cara não é estranha. É claro! É seu filho. Como está elegante. Parece mais com a mãe. Não tem essa cara branca avermelhada, cara de alemão. Cara de europeu Caucasiano, de onde vêm essas peles que fogem do sol quente e bronzeador. Seu filho tem pelo de latino. Latino americano, uma mistura de Catarinense com Baiano. É conterrâneo de Chico Buarque. É brasileiro, um híbrido representante da terra brasilis. O sorriso da foto lhe envia uma mensagem: “Pai! Estou bem.” Será que está bem? Esta bem, não é um bêbado. É advogado. É doutor nas leis.
As lembranças são muitas e nunca acabam. Não são poeiras que uma faxina revolve. São ferrugens que impregnam e vão corroendo. As lembranças mata aos poucos. Ou será saudade de tempos idos e vividos? Tempo das vacas gordas, bem aproveitado, bem gozado. Tempo em que sua palavra valia e sua voz ecoava nas salas de reuniões.
O remédio do crepúsculo está a espera para ser devorado. Não tem a fome necessária para sorver. O seu pecado da gula se mistura com o pecado do vício. Uma cachaça é o alívio do suplício solitário, outrora fora apenas prazer. Muito prazer obteve com a cachaça. Depois descobriu que era o seu pior câncer que mata o corpo e a alma. Põe suavemente o comprimido na boca, estica a mão e pega um copo no criado mudo e emborcando-o toma o seu volume. Percebe o erro, é tarde. Tinha tomado a cachaça no lugar da água. Um remorso e um arrependimento invade o seu ser. E agora? Grita para ver se alguém vem socorrer? Ou deita em seu leito maculado e espera o efeito passar? Não tem forças e o jeito é esperar, como ultimamente tem feito. Espera que alguém lembre do que foi, do professor que foi, do homem político que foi. Tudo outrora, tempos que não voltam. As pessoas passaram e ele ficou. O que é agora? Um nada deitado na cama moribundo esperando a morte chegar. A morte, última estação da vida terrena. Será que há céu?
Em sua mente passam lembranças boas e felizes que bem poderiam continuar se não fosse o maldito vício. Ficou confuso. Por que aquilo estava passando em sua mente? É uma revisão, uma síntese daquilo que foi e viveu. Fragmentos de momentos felizes. O casamento; o nascimento do filho; os diplomas políticos; as eleições em que quase desistiu; os bons projetos aprovados. Tudo isso trazia um prazer imenso. Sorria. Ria. Gargalhava. Mas sentia medo. Poderia ser o prenúncio da morte. O destino quer que tenha uma morte feliz, alegre, por isso traz as boas lembranças. Vem o sono, olhos pesados, e a vida ainda passa em sua mente. Passa devagar como para observar os pequenos detalhes. Os detalhes da felicidade. Sempre acreditou que a felicidade estava em observar bem os pequenos detalhes. Os detalhes da vida agora surgem como uma vida em detalhes. As lembranças passam. O sono chega. Adormece.
Joana chega para a visita diária. Ver como anda o seu paciente é um exercício que pacientemente realiza antes de ir para o hospital. Entra, a porta está só encostada, ordens médicas. Vai ao quarto e encontra o seu paciente deitado na cama, morto, e em seu rosto um sorriso congelado. Para Joana o professor Célio morreu feliz, como poderia ter sido na vida.

um pouco de meu trabalho

Eu matei... (Confissões de um presidiário) – Novela – FicçãoValter Figueira. Mato Grosso: Bork, 2006. 106 p. Série Nossos Autores, v. 9.O que leva uma pessoa simples a matar seus amigos inocentes? O leitor encontrará a resposta nesta obra (a primeira de uma trilogia de Valter Figueira) que conta a história de Homero Chaves, um presidiário condenado por receptação de veículo roubado e tráfico de drogas, e que decide, na prisão, contar sua história. O que ninguém sabe é que ele cometeu três assassinatos numa pequena cidade do Norte do Paraná.