24.8.15

Por que os políticos fazem plástica antes da eleição

                                Avaliar membros de sua espécie é uma tarefa importante para os mamíferos sociais, e eles a executam com eficiência. Acreditando nessa habilidade, o Homo sapiens organizou as democracias baseadas no voto universal. Mas existe um problema. Nosso cérebro e o cérebro dos macacos, que deram origem à espécie humana, foram selecionados durante milhões de anos para avaliar membros de nossa espécie com os quais interagíamos diretamente - indivíduos de nossos bandos ou tribos, cujo comportamento observávamos todos os dias e com quem nos comunicávamos constantemente. É dessa maneira que os machos e as fêmeas dominantes são escolhidos e os paramentos sexuais determinados. Selecionar um líder entre candidatos com os quais nunca interagimos é uma novidade para o cérebro humano, e não é tarefa que ele, mesmo educado, faça com facilidade. Se puder escolher, nosso cérebro prefere utilizar poucas informações obtidas em interações diretas. É por isso que os políticos andam pelas ruas cumprimentando o maior número possível de eleitores. Quando forçado a decidir com base em informações indiretas, os mecanismos utilizados pelo cérebro são primitivos e irracionais. A literatura científica está cheia de estudos que comprovam essa tese, mas um trabalho publicado recentemente demonstra quão primitivo é esse mecanismo.
                      Cientistas suíços selecionaram 57 pares de fotos de candidatos a eleições municipais francesas. Cada par continha uma foto do vencedor e uma do segundo colocado. Os pares foram mostrados para 684 adultos suíços que nunca haviam visto esses políticos. Sem informar quem eram as pessoas e nem mesmo que elas haviam sido candidatas a cargos políticos, os cientistas pediram que os suíços escolhessem o membro do par mais 'competente' e 'confiável'. Em 70% dos casos, o candidato avaliado como mais 'competente' havia sido o candidato eleito pelos franceses. Se adultos sem nenhuma informação além de uma foto fazem a mesma escolha que os eleitores, isso sugere que os mecanismos empregados para fazer a escolha são primitivos, talvez semelhantes aos utilizados pelas crianças. Para a confirmação dessa hipótese, os mesmos pares de fotos foram apresentados a 681 crianças com idade entre cinco e treze anos. As fotos foram mostradas no contexto de um jogo de computador, no qual as crianças deveriam escolher o melhor capitão para um barco que os guiaria em uma viagem perigosa. Os resultados com as crianças foram os mesmos que os obtidos com os adultos: elas escolheram o vencedor das eleições em 71 % dos casos. Isso sugere que os eleitores elegem seus líderes utilizando os mesmos mecanismos que o cérebro de uma criança usa para avaliar o rosto das pessoas.
                        Esse experimento é muito semelhante à maneira como os eleitores brasileiros são apresentados a candidatos ao Legislativo. Uma foto e uma frase. Mas o mais interessante é que esse experimento demonstra de forma científica um fato bastante conhecido dos políticos: a imagem da face, como ela aparece nas propagandas, é a principal fonte de informação utilizada por nosso cérebro quando ele é obrigado a fazer escolhas sem os dados da interação direta com o candidato. Não é de espantar que grande parte dos políticos se submeta a operações plásticas com o objetivo de se tornarem mais "competentes".
Este Texto faz parte do livro: “ A longa marcha dos Grilos Canibais”


 Fernando Reinach