23.7.10

Trechos do Livro "O retorno"

Trechos do romance “O retorno”


Caros amigos: aqui alguns trechos do romance “O Retorno” que está quase pronto com lançamento previsto para Setembro de 2010.

O caminho de casa é sempre como um retorno ao ventre materno. A busca do aconchego e do repouso. Um lugar de refúgio e solidão, a casa é sempre a nossa casa. Mesmo que ridículas e mal tratadas são sempre o lugar ideal para um refletir sobre a vida pregressa.

....A noite chega como uma fêmea no cio, devagar se esgueirando, querendo alguma coisa, tentando adentrar os recintos, até que, sem perceber já estamos familiarizados com a escuridão e com a brisa noturna. Os boêmios, as prostitutas e os amantes esperam a noite como um troféu, ou como um sinal verde para as suas ações, para os seus botes certeiros como cascavéis em cima de pequenos roedores. A noite é amiga dos escritores, dos poetas e dos bêbados, apesar de que alguns pés inchados não esperam anoitecer para encherem a cara, e inimiga das mulheres caseiras que ficam esperando pelos maridos em seus lares. “Onde ele está? Está enfiado num desses botecos bebendo com amigos, e depois chega cheirando a cachaça. Será que têm mulheres?” E assim vão, pais de famílias que tardam a chegada em casa para não depararem com a realidade nua e crua. Tanto nua como crua é horrível. A fuga está na bebida. Essa droga lícita que leva os homens a se imaginarem aquilo que sonhavam ser. E também algumas mulheres, quem disse que mulher não bebe?....

....Vozes o acusavam de assassino e gritavam: — Morra! Morra verme! Era isso, sentia um verme a corroer a sociedade limpa e santa que impera nessa cidade. Gritou: — Vocês também são pecadores! Assassinos! Bandidos! Ladrões! Isso lhe aliviada a angústia o cansaço e o desespero. O seu desejo era abandonar a rua e ir para casa, encostar sua cabeça no travesseiro e dormir, dormir o mais que puder e só acordar quando tudo isso acabar. Você matou Irene! Você cumpriu sua sina de assassino. Gritava uma das vozes em sua cabeça. Você é inocente! Gritava a outra voz quase sussurrando. Isso o estava enlouquecendo, e novamente ouve sua voz ecoar no vazio da cidade — Me deixem em paz! Isso é uma loucura. Quero ir para casa e dormir, só isso. Em sua cabeça uma música antiga. “Verônica me sinto tão só, quando não estás junto a mim, Eu quero te dizer.....Quero seus olhos olhar. Quero tua boca e seus lábios beijar”. Lembrou de Irene, lembrou de Vânia, lembrou da Marcinha que matou estrangulada no meio do cafezal. As mulheres que passaram por sua vida. Não é um assassino. Não matou Irene. Até quando vai ficar repetindo isso?....
.....Caminha, caminha, esse é o seu destino e desejo, caminhar e chegar inteiro em casa. Suas roupas já estão encharcadas, a chuva fina não deu sossego. Cambaleia, o que é isso? Não está bêbado! Ou está? “Não Irene! Não largo não! Você terá que morrer, aqui e agora. Tenho que salvar a Vânia. Por amor a ela vou lhe matar. O que é isso? Você é apenas uma vítima da sociedade que odeia e mata. Estou te matando em nome de um amor. Muitos mataram e matam ainda em nome de Deus. Você vai para o céu Irene, morrerá para salvar vidas e amores. Alguém tem que morrer por minhas mãos e escolhi você......

........O Homem pegou na mão de Homero e o fez caminhar. Ao aproximar de seu rosto, Homero o observou atentamente, rugas e pele áspera tornam um semblante carregado de história e marcado pelo passar do tempo. Não é Deus. Para Homero, Deus deveria ter um rosto eterno, sem marcas do tempo, sem rugas. O ambiente parecia ser o entardecer ou o amanhecer de um dia chuvoso.......

......Homero desceu do táxi ainda com aquele medo do encontro, não tinha idéia de como seria recebido. Durante o trajeto do hotel até a loja, tinha pensado muito no que dizer e como agir. Pediria desculpas por ter sido recluso. Mas seria bom se ela pedisse desculpas por tê-lo abandonado. Decidiu que não tocaria no assunto do abandono e nem da prisão.

O recomeço para ambos, significa esquecer o que de ruim aconteceu, isto é, se houver recomeço. Parece que a decisão está nas mãos de Vânia e não nas de Homero. Ele entrou na loja e em poucos segundos a localizou, os olhares se encontraram e ambos sorriam. Ela saiu do seu solitário refúgio e se apressou em direção ao visitante ilustre. Ele, sem saber se abria os braços para um fraterno abraço ficou esperando. Foi um encontro tímido com poucas palavras. E como numa atração mágica os corpos se uniram num apertado abraço. Os rostos se colaram e saiu da boca dela um choroso “Que Saudade!”. Novamente como uma atração de pólos magnéticos os lábios se colaram, não foi um beijo simples, mas um beijo que expressou toda a paixão que um sentia pelo outro.

Homero decidiu que precisava voltar ao Paraná, rever a mãe e pedir perdão pelo abandono. Rever alguns amigos e confirmar toda a sua história de vida. Depois do caso da morte de Irene Maria em que não lembra o que realmente aconteceu, nasceu na sua cabeça uma grande dúvida. Se realmente matou aquelas pessoas de seu passado ou se tudo foi fruto de sua imaginação.

.....O que intriga o padre é a semelhança que há entre os sonhos e o fato dos sonhos orientarem para o procurar. Outra coisa que as três senhoras falaram é o personagem do sonho dissera que o assassino está voltando. Como assim voltando? Será que o autor dos três assassinatos é a mesma pessoa? Questionou. Como alguém poderia cometer três crimes tão distantes e tão diferentes por motivos também diferentes um do outro? Essa questão estava queimando as têmporas do humilde servo de Deus e parecia que quanto mais rezava em busca de uma resposta mais perguntas apareciam.

......Olhando para a moça que juntava alguns cacos de telhas, o padre estremeceu. O que é isso, uma tentação do demônio? Um desejo pecaminoso levou o olhar do padre na direção do decote da moça. Seus seios volumosos lembravam aquelas atrizes americanas. “Seios de Pâmela Anderson”. A posição em que se encontrava Maria Rita dava ao padre uma visão mais aprofundada dos contornos dos seios.

Era a primeira vez, depois da ordenação, que Lourenço sentia aquilo. Desejo da carne. Desejo de possuir o corpo de uma mulher. “É uma criança! O que é isso?” se martirizava o padre por estar com pensamentos pecaminosos. Lembrou das promessas que fizera a Deus. Lembrou que era um servo de Deus a serviço da igreja. Mas lembrou também que era homem, e essa lembrança estava embaralhando seus pensamentos e deixando com nojo.

No começo tudo correu bem, o padre sabia que teria que resistir a tentação de simplesmente olhar para Maria Rita. Ceder aos pensamentos pecaminosos até que tinham certa saída, mas se esses pensamentos ultrapassassem a barreira do abstrato e invadisse o concreto, seria um desastre. “O padre Lourenço, meus Deus! Onde o mundo vai parar?” Eram essas as exclamações que pressentia. ....

......Um dia um professor no seminário falou que um besouro quando cai de costas nunca mais se levanta. Ele estava sendo esse besouro. Seu corpo estava pendendo, ora para a direita ora para a esquerda. Deixava cair de lado, mas teimava em cair de costas. Não! Isso não deveria acontecer! Poderia simplesmente livrar-se daquilo que o atormentava.

Retornar para casa, hoje casa de seus pais, não é mais um abandonar os ecos da rua. Retornar para casa está significando para Homero reviver um passado que estava perdido. Encontrar o pai depois de tanto tempo, não está fácil para ele. Sente uma raiva tremenda e uma sensação de dúvida do que viera buscar. Ele busca a verdade e se pergunta qual é a verdade que se busca. Quer esconder o pai de si mesmo por recusar a aceitar que ele esteja vivo. Não quer acreditar que o pai estivera bem todo o tempo em que ele e a mãe choraram de fome e sofreram com a miséria. O abandono do pai foi um crime contra a família, contra dois entes inocentes.

.....O motel é um refúgio para os amantes que procuram a cegueira e a mudez das paredes e tetos dos quartos preparados para o ritual do amor que antes era apenas da procriação. Dizem os cientistas que se não fosse o prazer que se sente ao realizar o ato sexual, o humanidade havia se evaporado da face da terra. Ainda bem que há prazer no sexo, muito mais que a dor do parto.

..... Para Sônia ir ao motel não era novidade, mas ir ao motel com o seu amigo enigmático e carrancudo, seria. Seria novidade e uma experiência nova. Saberia como se comportaria aquele seu amigo tímido e misterioso de antigamente e que agora, nessa nova fase, superou a timidez e continua misterioso.

......Amaram-se como amam os verdadeiros amantes depois de um celibato prolongado. Amaram-se como se amam os casais apaixonados depois de uma reconciliação. Amaram-se como se deveria amar, na simplicidade da vida e do amor. A paixão é complexa, mas o amor não. Eles se amaram com amores promissores e eternos, não como uma paixão fugaz.

.....Ele vivia nesses dois extremos. Fugia de casa para ser feliz, não mais buscava refúgio em casa para fugir dos olhares de desprezo da sociedade. Agora, por mais incrível que pareça, era a sua casa que o desprezava. Não! Nem seu pai ou sua mãe sentia desprezo pelo filho. Ele é que sentia que não teria trégua numa guerra imaginária contra o pai. O velho está imóvel na cama, solitário, agora mais do que nunca parece que fora abandonado pelos seus. Quem são os seus que ele mesmo o abandonara?

.....Ivan acordou com uma sensação de que algo o estava sufocando, abriu os olhos e não conseguiu enxergar nada, alguma coisa pesada comprimia seu rosto e dificultava a respiração. É a morte – pensou – Não queria morrer assim, sem antes solicitar o perdão de todos: da esposa, tão dedicada e fiel, do filho que cresceu sem a presença do pai herói que ele um dia prometera ser.

.....Uma dor intensa nos pulmões, precisa de ar, o agressor não dá sinal que deixará respirar. Está na hora de partir para o infinito. Tornará pó. Do pó vieste e ao pó retornará. Gostaria de ser Fênix e renascer das cinzas, recomeçar. Algo está apagando, não lembra mais o que foi e o que é. Está difícil, será que é a morte. Cadê o menino sorridente no campo de trigo?
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20.7.10

Ama-me quando eu menos merecer, pois é quando eu mais vou precisar...." (Provérbio Chinês)