Avaliar membros de
sua espécie é uma tarefa importante para os mamíferos sociais, e eles a
executam com eficiência. Acreditando nessa habilidade, o Homo sapiens organizou
as democracias baseadas no voto universal. Mas existe um problema. Nosso
cérebro e o cérebro dos macacos, que deram origem à espécie humana, foram
selecionados durante milhões de anos para avaliar membros de nossa espécie com
os quais interagíamos diretamente - indivíduos de nossos bandos ou tribos, cujo
comportamento observávamos todos os dias e com quem nos comunicávamos
constantemente. É dessa maneira que os machos e as fêmeas dominantes são
escolhidos e os paramentos sexuais determinados. Selecionar um líder entre
candidatos com os quais nunca interagimos é uma novidade para o cérebro humano,
e não é tarefa que ele, mesmo educado, faça com facilidade. Se puder escolher,
nosso cérebro prefere utilizar poucas informações obtidas em interações
diretas. É por isso que os políticos andam pelas ruas cumprimentando o maior
número possível de eleitores. Quando forçado a decidir com base em informações
indiretas, os mecanismos utilizados pelo cérebro são primitivos e irracionais.
A literatura científica está cheia de estudos que comprovam essa tese, mas um
trabalho publicado recentemente demonstra quão primitivo é esse mecanismo.
Cientistas suíços
selecionaram 57 pares de fotos de candidatos a eleições municipais francesas.
Cada par continha uma foto do vencedor e uma do segundo colocado. Os pares
foram mostrados para 684 adultos suíços que nunca haviam visto esses políticos.
Sem informar quem eram as pessoas e nem mesmo que elas haviam sido candidatas a
cargos políticos, os cientistas pediram que os suíços escolhessem o membro do
par mais 'competente' e 'confiável'. Em 70% dos casos, o candidato avaliado
como mais 'competente' havia sido o candidato eleito pelos franceses. Se
adultos sem nenhuma informação além de uma foto fazem a mesma escolha que os
eleitores, isso sugere que os mecanismos empregados para fazer a escolha são
primitivos, talvez semelhantes aos utilizados pelas crianças. Para a
confirmação dessa hipótese, os mesmos pares de fotos foram apresentados a 681
crianças com idade entre cinco e treze anos. As fotos foram mostradas no
contexto de um jogo de computador, no qual as crianças deveriam escolher o
melhor capitão para um barco que os guiaria em uma viagem perigosa. Os
resultados com as crianças foram os mesmos que os obtidos com os adultos: elas
escolheram o vencedor das eleições em 71 % dos casos. Isso sugere que os
eleitores elegem seus líderes utilizando os mesmos mecanismos que o cérebro de
uma criança usa para avaliar o rosto das pessoas.
Esse experimento é
muito semelhante à maneira como os eleitores brasileiros são apresentados a
candidatos ao Legislativo. Uma foto e uma frase. Mas o mais interessante é que
esse experimento demonstra de forma científica um fato bastante conhecido dos
políticos: a imagem da face, como ela aparece nas propagandas, é a principal
fonte de informação utilizada por nosso cérebro quando ele é obrigado a fazer
escolhas sem os dados da interação direta com o candidato. Não é de espantar
que grande parte dos políticos se submeta a operações plásticas com o objetivo
de se tornarem mais "competentes".
Este
Texto faz parte do livro: “ A longa marcha dos Grilos Canibais”
Fernando Reinach
2 comentários:
Muito interessante essa informação.Leva a gente a refletir e eu começo a entender porque ,de uma maneira geral,as pessoas escolhem tão mal. Não apenas políticos, mas também amores,etc. A escolha é feita pela estética,issso que eu entendi ? Como sempre seu blog tá muito bom
Que texto incrível! Em muitas coisas ainda utilizamos o nosso cérebro reptiliano, mas nunca imaginei que para escolher candidatos também. Quanto às plásticas, agora já existe o fotoshop, o que facilitou muito para esses cidadãos. Muita paz!
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